No Yoga Sutra, Patanjali traz definições, conceitos e práticas psíquicas sobre Yoga. Ele faz a seguinte definição: “Yoga é a inibição das modificações da mente”. Depois, ele define essas modificações: “As modificações da mente são de cinco tipos e são dolorosas ou não dolorosas”. Em seguida, ele define as modificações dolorosas: “Dor (mental), desespero, nervosismo e respiração difícil são sintomas de uma condição mental dominada por distrações”. Nessa primeira parte Patanjali define o Yoga como uma prática mental, e define os sintomas (sofrimentos) e a causa desses sofrimentos.
Na segunda parte do seu texto Patanjali se concentra nas técnicas para combater a falta de controle da mente e o sofrimento advindo disso. Nesse sentido, ele vai dizer que “(Kriya Yoga) é praticada para atenuar os kleshas e produzir o samadhi“, levando em consideração a definição de Klesha como dor, aflição e miséria, assim como suas causas.
Em seguida, ele fala das técnicas utilizadas pelo Yoga para equilibrar a mente, a chamada Ashtanga Yoga ou Yoga de Oito Partes: “Auto-Restrições; Observâncias; Postura; Controle da Respiração; Abstração; Concentração; Contemplação e Êxtase são as oito partes (da autodisciplina do Yoga)”.
Importante notar que quando Patanjali fala de postura ele está se referindo aos asanas das aulas de Yoga, como elas ficaram conhecidas no ocidente, ou seja, como uma série de posturas físicas. Mas a importância dada ao aspecto mental é bem maior do que a menção às posturas físicas. Aliás, para Patanjali, as posturas físicas são somente uma técnica para se alcançar o equilíbrio mental. Digamos que, dessas oito partes, o ocidente, em média, pratica somente duas: Posturas Físicas (asanas) e Controle da Respiração (pranayama). Com ênfase nas Posturas Físicas.
Patanjali ainda detalha as Auto-Restrições e Observâncias devido à capacidade da prática desses valores em equilibrar a mente: “Os votos de auto-restrições compreendem abstenções de violência, de falsidade, de roubo, de incontinência e de cobiça” ; “Pureza, contentamento, austeridade, auto-estudo e auto-entrega constituem as observâncias”.
Dessa forma, ele indica o caminho a seguir para quem busca o equilíbrio mental, mostrando que o Yoga pode sim contribuir para o controle da mente e produção de bem-estar. Aliás, Patanjali, em seus Sutras, dá ênfase ao Yoga como uma prática de controle mental. Mas, e como podemos comprovar na prática essa eficácia?
Alguns artigos científicos comprovam a eficácia do Yoga no tratamento de sintomas de transtorno mental. Vorkapic e Rangé (2011) fizeram uma ampla busca em bases de dados científicos por pesquisas que estudaram os benefícios do Yoga nos transtornos de ansiedade. Das sete pesquisas realizadas entre 1995 e 2009, seis mostraram um índice de correlação significativa entre a prática do Yoga e a diminuição do estresse ou ansiedade. Sendo que, na única pesquisa em que não houve diferença nos níveis de ansiedade, pôde-se notar um aumento de vitalidade, energia, melhora da dor física e interação social.
Eles chamam a atenção para o fato de a ansiedade excessiva ser um sintoma comum à maioria dos transtornos mentais, o que pode ser um bom marcador para o Yoga como terapêutica nos tratamentos de transtorno mental.
Guerreiro e Palmeira (2005) comparam os benefícios psicológicos proporcionados pela prática do Yoga e a prática de outras atividades físicas. Para tanto, foram utilizadas variáveis de bem-estar subjetivo em ambos os grupos de estudo. Os resultados encontrados demonstraram que a prática do Yoga foi mais eficaz em produzir bem-estar subjetivo do que outras atividades físicas (Basquete, Danças Sociais e Ginástica Rítmica).
Vorkapic (2012) estudou o efeito do Yoga na redução da sintomatologia de pacientes com transtorno de pânico. Foram formados dois grupos, um que participou de sessões de terapia Cognitivo Comportamental e outro que participou de práticas de Yoga. Os resultados mostraram que houve uma significativa redução nos níveis de ansiedade, sensações corporais associadas ao pânico, número e intensidade dos ataques e melhora na qualidade de vida apenas nos sujeitos que frequentaram as sessões de Yogaterapia.
Partindo para a parte prática, como devemos então, diante disso tudo, montar uma aula de Yoga para portadores de transtorno mental grave? Dr. Rishi Vivekananda (2005), em seu livro Pratical Yoga Psychology, propõe uma sequência de aula para esse público. Essa sequência, inicialmente muito parecida com qualquer aula de Yoga, inclui uma série para as articulações, seguida de posturas em pé, sentado e deitado.
Mas Dr. Vivekananda chama atenção para o cuidado que se deve ter com as posturas interiorizantes (como a postura da criança) que podem ser boas para pacientes ansiosos ou depressivos mas podem ser muito angustiantes para pacientes esquizofrênicos e borderlines. Por isso, é preciso ter critério para a escolha de posturas, dependendo dos alunos.
A utilização de técnicas respiratórias como o Ujai (leve vibração na garganta durante a passagem do ar), a respiração alternada (nadi shodana) e a respiração relaxante (exalar no dobro do tempo da inspiração) são muito recomendadas pois possuem efeito suavizante sobre o sistema nervoso.
Mas é preciso ter cuidado com algumas técnicas, como as respirações energizantes Bhastrika e Kapalabhati, pois possuem um efeito estimulante sobre o sistema nervoso (PAKER, 2008, p. 286-287). Esse efeito pode ser ótimo no caso de alunos com depressão, mas pode, teoricamente, exacerbar ainda mais um paciente que esteja maníaco. Nesse caso, é preciso ter critério para aplicar.
Os Bhandas (chaves) como contração do períneo, abdômen enrijecido, e queixo no peito devem ser muito utilizados pois possuem capacidade de dissolver emoções ruins, segundo Dr. Rishi Vivekananda (2005).
O savasana (postura de relaxamento) e o Yoganidra (relaxamento induzido) são recomendados, assim como a meditação. No entanto, essas três técnicas também precisam ser aplicadas com muito critério, pois são extremamente interiorizantes, sendo novamente não recomendadas para alunos esquizofrênicos e borderlines.
Poderíamos recomendar a não aplicação dessas técnicas para pacientes com sintomas psicóticos. Na verdade, nesses casos, recomenda-se a utilização do relaxamento progressivo de Jacobson feita de olhos abertos. No entanto, pacientes sem sintomas psicóticos poderiam se beneficiar enormemente delas.
O estudo das Auto-Restrições (yamas) e Observâncias (niyamas) do Yoga como uma terapia de grupo também é uma técnica recomendada para a produção de equilíbrio mental. Assim como a promoção do protagonismo dos alunos, criando condições para que os mesmos, caso se interessem, possam se tornar professores de Yoga, através de um programa de formação. Combate-se, dessa forma, a exclusão historicamente e injustamente imposta a essas pessoas.
Para concluir, podemos afirmar que o Yoga se mostra extremamente eficaz no tratamento de pacientes portadores de transtorno mental grave, desde que aplicado com critérios, como, aliás, deve ocorrer na aplicação do Yoga para qualquer outra finalidade.
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